Os honorários e a inexplicável resistência na aplicação do art. 85 do CPC

A valorização da advocacia é fundamental para o fortalecimento da sociedade. Essa  valorização passa, certamente, por uma remuneração justa e equânime, que seja condizente com a relevância social dos serviços prestados. A busca por uma remuneração justa nada mais é que a inegociável luta por respeito ao trabalho do advogado.

Recebo, sistematicamente, a reclamação de colegas quanto à não aplicação da lei e do sistema de precedentes na fixação dos honorários advocatícios. Sob qualquer ótica que se possa avaliar, a resistência de alguns magistrados na aplicação dos parágrafos 2º ou 3º do artigo 85 do CPC e do precedente trazido pelo Tema nº 1.076 do STJ é um desrespeito com todo o sistema de justiça. Além de causar evidente desperdício de recursos públicos, em função de novos julgamentos a envolver toda a máquina judiciária.

Tenho sustentado nas tribunas do STJ e dos tribunais regionais e estaduais que o papel do julgador é aplicar a lei e o do legislador, legislar. Realço que suas funções não se comunicam, pois cada qual deve exercer a sua prerrogativa. Se o magistrado, quer legislar, que se apresente no processo eleitoral, assim como se o legislador quisesse julgar, deveria fazer concurso para juiz.

Não padecendo a norma de vício de inconstitucionalidade, declarado na forma da lei, compete ao julgador aplicar os parágrafos 2º ou 3º do artigo 85 do CPC, independentemente do valor que venha a ser apurado para os honorários advocatícios, eis que estamos tratando de verba de natureza alimentar para a advocacia e da observância da lei como princípio garantidor de uma democracia.

Desde que iniciei minha trajetória na OAB, quando apresentamos as soluções legislativas, posteriormente, incorporadas pelo CPC para acabar com a famigerada compensação da verba honorária e o seu aviltamento, tenho afirmado que os honorários advocatícios são para o advogado o mesmo que os subsídios para a magistratura. Com o destaque de que o advogado pode lutar por toda uma vida sem que tenha uma determinada causa expressiva que lhe garanta a aposentadoria.

A fixação de honorários por equidade, não pode ocorrer por arbítrio. E tampouco pode ser o magistrado contrário ao conteúdo expresso da lei e no sistema de precedentes, pois estará, de forma frontal, violando vetores essenciais do ordenamento jurídico que são os princípios da legalidade e da própria segurança jurídica.

Não reconhecer a aplicação da lei é permitir que todo o trabalho legislativo e da corte superior se percam sem que haja fundamento legal para tanto, o que seria um verdadeiro retrocesso para nossa democracia.

Em que pese já estivessem consignadas de forma absolutamente cristalina no Código de Processo Civil, as balizas objetivas expressas nos parágrafos 2º ou 3º do artigo 85 foram, por ocasião do Tema 1.076 do Superior Tribunal de Justiça, reafirmadas, com a seguinte tese: “A fixação dos honorários por apreciação equitativa não é permitida quando os valores da condenação, da causa, ou o proveito econômico da demanda, forem elevados. É obrigatória, nesses casos, a observância dos percentuais previstos nos parágrafos 2º ou 3º do artigo 85 do Código de Processo Civil”.

O Tema 1.076 do STJ colocou uma pá de cal sobre eventual controvérsia quanto à aplicação dos parágrafos 2º ou 3º do artigo 85 nas causas de valores expressivos ou muito elevados, afirmando sua aplicação de forma muito clara e objetiva. Portanto, não se trata aqui de discutir se o valor dos honorários é expressivo ou não, mas sim de aplicação da lei e do precedente que tem força vinculativa, sob pena de se estar fomentando indevida insegurança jurídica e negando vigência também aos artigos 927 e 1039 do Código de Processo Civil, que vinculam a aplicação da tese firmada.

Está mais do que claro que a aplicação do § 8º (apreciação equitativa) do artigo 85 se dá apenas de forma subsidiária, ou seja, quando não for possível a aplicação dos critérios objetivos do § 2º, do artigo 85, o que – como relatei no início deste artigo – vem sendo descumprido, de forma sistemática e inexplicável, por alguns magistrados que deveriam ser os primeiros a cumprir a lei, pois para tal foram investidos na função.

Ao não aplicar a lei e o precedente, estes magistrados estão a gerar mais recursos para um Judiciário já sobrecarregado de processos, além de custos desnecessários para o erário.

*Cláudio Lamachia é sócio da Lamachia Advogados, membro Honorário Vitalício da OAB Nacional, presidiu o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil – Triênio 2016/2018, presidiu a seccional gaúcha da Ordem dos Advogados do Brasil – Triênios 2010/2012 e 2007/2009.

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Claudio Lamachia